sexta-feira, 30 de setembro de 2016

MASSAGEM


Mattoso explicitando: "Um de meus proximos livros, intitulado CURSO DE
REFLEXOLOGIA, tracta dos pés como objecto de massagem therapeutica.
Embora alguns achem que sacaneio debochadamente a massotherapia podal,
reaffirmo que só sacaneio respeitosamente. Antes de mostrar um dos
poemas thematicos do livro, quero exhibir um video bem didactico para
não deixar duvidas sobre a veracidade das minhas theorias holisticas."


Como massagear um pé tamanho grande:




SONNETTO 437 "DIDASCALICO"

Akira, o professor, me disciplina.
Apprendo a descalçar sapato e meia
usando, não a mão, que elle me freia,
porem a bocca, affan que não termina...

Por fim a meia sae. A pelle fina
do dorso, onde advoluma-se uma veia,
e a sola grossa a lingua massageia,
emquanto a voz do Mestre instrue, ferina.

Lambidas sejam lentas: "Não tem pressa!",
exige o Superior, refestelado.
Somente seu prazer é o que interessa.

"Assim que eu gosto!", falla com enfado.
E em cada vão de artelho que attravessa,
a lingua leva um tempo demorado...


///

LÍNGUA


Mattoso recapitulando: "Em 1977 fiz um sonnetto marginal chamado SPIK
(SIC) TUPYNIK e em 1984 Caetano lançou a canção LINGUA no disco VELÔ,
mas isso não significa que eu tenha suggerido algo que Caetano
approveitou. Pelo contrario: eu é que era influenciado pelo tropicalismo
e quiz sonnettizar o hybridismo anthropophagico da cultura tupyniquim. A
citação de Caetano apenas me incluia entre outros representantes desse
mesmo eclectismo em que accabei transformando o sonnetto emquanto genero
classico que pode ser crassico, ou crassista em vez de classista. Aqui
repriso esses dois momentos."





SPIK [SIC] TUPYNIK (SONNETTO 2)




Rebel without a cause, vomito do mytho
da nova nova nova nova geração,
cuspo no prato e janto juncto com palmito
o baioque (o forrock, o rockixe), o rockão.
Receito a seita de quem samba e roquenrola:
Babo, Bob, pop, pipoca, cornflake;
take a cocktail de coco com cocacola,
de whisky e estrychnina make a milkshake.
Tem hybridos morphemas a lingua que fallo,
meio nega-bacana, chiquita-maluca;
no rolo embananado me embollo, me embalo,
soluço - hic - e desligo - clic - a cuca.

Sou luxo, chulo e chic, caçula e cacique.
I am a tupynik, eu fallo em tupynik.


///

TOMMY EDISON


Mattoso respondendo: "Um leitor pergunta como consigo reagir com bom
humor às mensagens sadicas e sarcasticas dos bullyingueiros. Mas eu não
reajo com bom humor! Reajo com tesão masochista! Quem reage com bom
humor é um cego americano chamado Tommy Edison que, para começo de
conversa, é critico de cinema. Multimidiatico, elle se communica pelas
redes sociaes, sempre commentando de que maneira é affectado pela
cegueira na vida practica. Frequentemente, seu computador fallante lhe
passa (tal como o meu) os recados mais humilhantes, chamando-o de
cadella para baixo e suggerindo que deva comer merda. Quem entende
inglez vae curtir o espirito esportivo delle ante tal bullying. De minha
parte, thematizo isso em sonnettos como este, que estão no recem lançado
livro DESILLUMINISMO."


Mean comments to Tommy Edison:




SEM DOR NEM DÓ (SONNETTO 1071)




Ficou cego? O problema não é meu!
A minha vista é boa! Eu approveito
a vida como quero! Foi bem feito
você perder a pose! Se fodeu!

Tá achando tudo escuro que nem breu?
Tem mais é que soffrer! Eu me deleito
sabendo que não tenho esse defeito
nos olhos! Cê que chore o que perdeu!

Emquanto eu vejo o mundo livremente,
você tem que chupar a minha rola
calado! Si eu gozar, você que aguente!

E tire da cabeça a idéa tola
de que outros vão ter dó! Cê tá impotente!
Quem pode põe-lhe a picca, e eu posso pol-a!


http://www.submarino.com.br/produto/16384809/glauco-mattoso-desilluminismo

http://www.americanas.com.br/produto/16384809/glauco-mattoso-desilluminismo?loja=19184242000100

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MELOPÉA


Mattoso recapitulando: "Em 2001 sahiu pelo sello Rotten Records o CD
intitulado MELOPÉA, que incluia alguns sonnettos musicados pelos mais
diversos interpretes e grupos, no estylo eclectico de TROPICALIA. Por
emquanto ninguem se dispoz a postar no youtube faixa por faixa, mas
alguem ja se addeantou e disponibilizou o link abbaixo. Até que
apparesçam novos links com imagens excolhidas por cada interprete, dou a
lista das faixas com a minha declamação."


Gravação original:




TATO FISCHER: TROPICALISTA [150]




INNOCENTES: PREGUICISTA [427]




ARNALDO ANTUNES: CONFESSIONAL [234]




HUMBERTO GESSINGER: REVISTA [377]




DJ KRANEO (RODRIGO LEÃO): UTOPICO [287]




EDVALDO SANTANA: BELLICO [273]




LUIZ ROBERTO GUEDES & FABIO STEFANI: PACIFISTA [274]




ELEFUNK: VIRTUAL [284]




WANDER WILDNER: ENSAISTICO [241]




365: DESERTADO [352]




AYRTON MUGNAINI: FLATULENTO [192]




BILLY BROTHERS: ESCATOLOGICO [72]




DEVOTOS: DERCY GONÇALVES [270]




DJ KRANEO (RODRIGO LEÃO): INESCRUPULOSO [129]




FALCÃO & ERIBERTO LEÃO: PRECIPUO [429]




ALEXANDRE NERO: MANIFESTO OBSONETO [8]




LARANJA MECHANICA: CONFESSIONAL [234]




MADAN: AO MAIOR [214]




ITAMAR ASSUMPÇÃO & RENATA MATTAR: AMELIA E EMILIA [259]




CLAUDIA WONDER & EDSON CORDEIRO: VIRTUAL [284]



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sexta-feira, 2 de setembro de 2016

TORNEIO


Mattoso recapitulando: "Em 1990, eu commentara no gibi CHICLETTE COM
BANANA o Campeonato Annual de Tennis Podres (Annual Rotten Sneaker
Contest) que premia o pé mais chulepento dos States. Naquella occasião,
o concurso estava na 15ª edição. Em 2008, em sua 33ª edição, o evento
ganhava o noticiario internacional com videos e photos na rede virtual,
mostrando o vencedor, Ben Russell, um garoto de quinze annos, cujos
tennis fedidos lhe valeram um premio em dinheiro e uma viagem a Nova
York. A etapa final do campeonato occorreu na cidade de Montpellier,
estado de Vermont. Eis o contehudo que circulou pelas agencias de
noticias."

[Montpelier, Vermont - March 19, 2008: Montpelier is once again the
location for some really smelly foot wear. The 33rd annual Rotten
Sneaker Contest was held there Tuesday-- with local "talent" matched up
against stinky feet from around the country. This year's winner was
Benjamin Russell from Eagle River, Alaska. He won $2,500, a trip to New
York City and a supply of Odor-Eaters products. Eight kids, ages seven
to fifteen, from across the country, descended on the small town of
Montpelier today wearing sneakers so decrepit and odorous, even the town
dump wouldn't take them. Why? To participate in the annual National
Odor-Eaters Rotten Sneaker Contest. Each has won a regional contest and,
therefore, earned a place in the national finals. In the end,
Fifteen-year old Benjamin Russell took home the grand prize with a pair
of two year-old sneakers that nearly caused the judges to pass out.
Celebrating its 33rd year, the National Odor-Eaters Rotten Sneaker
Contest is the ultimate test of just how offensive sneakers can get when
they're not taken care of properly. Ben Russell has a title most people
would walk away from. Russell, 15, from Eagle River, Alaska, beat seven
other contestants from around the country to claim the title of
rottenest sneakers in the country. He won the championship in
Montpelier, Vermont, in the annual Odor-Eaters Rotten Sneaker Contest,
sponsored by the shoe insert maker.]


Torneio de tennis (competidor: Ben Russell)



Torneio de tennis (competidor: Chris McNutt)




Torneio de tennis (competidor: Kane Young)



Torneio de tennis (competidor: Logan Smith)



Torneio de tennis (competidor: Mason Young)




SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (I) [2391]

Cansei ja de fallar, mas pouca gente
em mim accreditou. Agora um novo
evento patenteia como o povo
de la tem seu costume differente.

Refiro-me aos Esteites: nota urgente
agita as redacções, e eu me promovo,
pois, graças, de Colombo, a mais um ovo,
estou, faz tempo, nisso experiente.

Consiste num concurso de chulé
a exotica noticia que, aos jornaes
daqui, foi facto extranho, mas não é...

Um joven (quinze anninhos) foi quem mais
narizes convenceu de que seu pé
meresce menos bronca de seus paes...


SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (II) [2392]

Ja desde a velha decada de oitenta
que eu faço do torneio propaganda,
mas custa, por aqui, que a coisa expanda
seu nivel de interesse, e a marcha é lenta.

O patrocinador que, la, sustenta
o evento é algum perfume de lavanda
ou pinho, que o custeia e aos jovens manda
que exhibam a chulapa chulepenta.

Moleques cujos tennis tenham cheiro
mais podre, e que à distancia o jury o sinta,
são fortes candidatos a primeiro...

Porem só ganha o premio quem la pinta
disposto a ver seu pé cheirado, inteiro,
por "velhos" que até tenham mais de trinta...


SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (III) [2393]

Quando é preliminar, julga a disputa
um corpo de jurados bem menor,
de apenas trez ou quattro, que o suor
do joven acquilata em regra arguta.

Ja fui desses juizes: quasi chuta
meu rosto um marmanjão, que era o peor
chulé da California, um pé maior
até que o dum adulto, e expressão bruta.

Na sola lhe fucei, e o cara ria
emquanto entre seus dedos meu nariz
metti, pois desse jeito se advalia...

Lhe dei ponctuação que o fez feliz
e, apoz ganhar o premio, elle queria
até me dar seu tennis... E eu o quiz!


SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (IV) [2394]

Guardei essa reliquia, e ainda a adspiro,
mas ja perdeu o cheiro que ganhara
o titulo local. Aquelle cara
venceu mais campeonatos, virou "hero".

A scena está bem viva: lhe retiro
do pé, bem lentamente, a joia rara
que à prancha do skatista se compara,
tamanho o comprimento... E quasi piro!

Por dentro, aquelle tennis parescia
a fossa destampada e envenenada
que a gente ja cheirou, na vida, um dia...

Bem fundo cafunguei e, para cada
quesito, constatei, com alegria,
mais podre não haver, em jogo, nada...


SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (V) [2395]

Quem eram, me perguntam, os juizes
que estavam, a meu lado, dando nota
a um joven que descalça sua bota,
seu tennis, seu sapato...? Astros? Actrizes?

Será que elles se sentem tão felizes
e honrados quanto eu mesmo? Não denota
nenhum delles pedir a quem lhe bota
na cara a sola: "Quero que me pises!"

São mães, são pharmaceuticos, são, numa
local communidade, quem lecciona,
quem treina, e com "teenagers" se accostuma...

No meio delles, claro, está um cafona
e sobrio funccionario, que não fuma,
só vende seu Advanço ou seu Rexona...


SONNETTO PARA UM INFAME CERTAME (VI) [2396]

No tempo do "Chiclette com Banana",
gibi no qual fui sujo columnista,
fiz sobre o caso um texto, a que a revista
deu optimo destaque e um ar sacana.

Lidissimo na zona suburbana,
por toda uma galera de skatista,
rockeiro e fanzineiro, está na lista
dos "classicos" o artigo que me ufana.

Por causa do relato, ainda sou,
às vezes, convidado, mas ja não
viajo: cego e triste, perco o show...

Anima-me, entretanto, que um pezão
fedido 'inda concorra, e agora estou
torcendo pela nova geração...


Sobre o methodo de escripta adoptado pelo auctor, accessem:
http://correctororthographico.blogspot.com.br

Contacto directo com o auctor: mattosog@gmail.com

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TOMMY


Mattoso recordando: "Alem de obra-prima cinematographica em si mesma, a
versão filmada de TOMMY dirigida por Ken Russell retracta fielmente a
imaginação sadomasochista de Peter Townshend, principalmente na canção
'Cousin Kevin', para mim a mais symbolica quanto ao bullying de cegos
pelos normovisuaes. Um de meus innumeros sonnettos sobre o thema está no
livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir na edição
impressa."




GEMMAS DO CINEMA (VIII) [sonnetto 4064]

Ainda de Ken Russell é a versão
de "Tommy" para as telas. Nella, o cego,
que nada diz nem ouve, aguenta o prego
da cruz aos pés dum primo folgadão.

Deixaram-no os adultos bem na mão
de Kevin, o priminho que tem ego
de sadico e nazista: "Agora eu pego
você! Vamos brincar! Que diversão!"

E o primo se approveita da cegueira
de Tommy: o faz de gatto e de sapato,
practica nelle tudo quanto queira.

A scena mostra a cara do cordato
ceguinho entre dois pés que a costumeira
botina calçam: close em poncto exacto.


Sobre o methodo de escripta adoptado pelo auctor, accessem:
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SOLAS


Mattoso recuperando: "Do tempo em que eu enxergava são estes trechos do
livro MANUAL DO PODOLATRA AMADOR. Ja na era digital, compenso a cegueira
gravando declamações em video, accompanhadas de imagens escaneadas.
Quero ver (Ops!) si algum leitor tem o pé grego e chato alludido nos
sonnettos..."

{Tudo isso me carreou reputação parallela à de poeta maldicto, que, até
ser temporariamente relegada ao limbo com a chegada da cegueira,
renderia no minimo uma bella pasta de correspondencia, volumoso
inventario de depoimentos, confidencias, propostas e phantasias. Alguns
missivistas se prendiam aos telegraphicos limites do aerogramma, onde só
uma face do papel era approveitavel. Conseguiam approveital-a ao maximo,
traçando com canneta o contorno da sola appoiada sobre a folha e
escrevendo dentro do contorno. Ommitto os nomes dos remettentes, mas as
palavras são litteraes.}

{Glauco, o que mais me excitou na entrevista (Folha-SP) foi o character
libertador, anticonsumista e antiesthetico que possibilitou a minha
acceitação do meu pé superdotado. Cada vez que você mencionava um pé em
verdadeira idolatria eu o imaginava deante dos meus dedões purulentos
com resquicios de bichos-de-pé não de todo extirpados na infancia. Me
contorci de prazer ao imaginar o fim de minhas frieiras ao contacto de
sua lingua asquerosa. Foi tão importante para mim esta acceitação da
minha autoimagem que eu vou abandonar o uso dessa litteratura
submundista que era a unica forma de extravasar meus impulsos
reprimidos.}

{Glauco, achei o maior barato sua entrevista na "Folha da Tarde". Segue
o formato e tamanho do pé, tenho os dedos com alguns pellinhos e uma
frieira no mindim, em tractamento ha 2 annos. Sou vidrado nos pés das
minhas namoradas, ellas ficam com um tesão intenso, que culmina em OMs
(orgasmos multiplos). [...] Não o achei louco maluco, te achei
liberado.}





IMPERFECCIONISTA (SONNETTO 401)
https://www.youtube.com/watch?v=wqoPIKo8RHQ

Agora lhes descrevo o pé que adoro:
Maior que o meu, portanto masculino,
ainda que pertença a algum menino,
suado até, por tudo quanto é poro.

Fedido de chulé: nunca inodoro.
Sapato ou bota: em couro nada fino.
Assim, folgado e sadico, o imagino,
egual aos que da infancia rememoro.

Mais longo o indicador que o pollegar,
na planta é plano, e não do typo cavo.
Percebem onde, emfim, quero chegar?

O pé que idealizo, beijo e lavo
na lingua, no tesão, no paladar,
é aquelle que me tracta como escravo.


SADO REPISADO (SONNETTO 3444)
https://www.youtube.com/watch?v=ksvJKvuFOE4

Dum pé sadico o formato
de explanar jamais me enfado.
Nunca é cavo: é longo e chato,
vãos nos dedos, "espalhado".

Sim, de facto, um "pé de pato",
"bicco largo" no calçado.
Esse é o thema de que eu tracto
si me humilho e me degrado.

Bem mais curto é o "pollegar",
si a medil-o alguem chegar,
do que o dedo "indicador".

Eis o molde a que, em sonnetto,
sob a sola me submetto,
seja a "prancha" de quem for.


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LAVANDERIA


Mattoso recordando: "No filme MINHA ADORAVEL LAVANDERIA, um de meus
predilectos emquanto pude assistir, fica evidente o papel dos pés na
cultura pakistaneza, mesmo quando ambientada em Londres: o patriarcha da
familia é massageado nos pés pelas meninas, o filho corta as unhas dos
pés do pae e é pisado na cara pelo primo. Vale reprisar o que thematizo
no sonnetto abbaixo, incluido no livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem
previsão para sahir na edição impressa."




GEMMAS DO CINEMA (VII) [sonnetto 4060]

Descalço é o pé que Stephen Frears grava,
em close, sobre a cara do ladino
rapaz pakistanez que, em Londres, tino
demonstra si, por grana, roupas lava.

O primo é quem o pisa, si uma escrava
não tem na propria esposa. Esse menino
pisado, por signal, tem um londrino
punkinho como caso, se notava.

Do pae cortava as unhas do pezão
e, agora, o primo pisa em sua cara
com força, com despeito e com tesão.

Paresce que normal ja se tornara,
naquelles que proveem do Pakistão,
ter pelos pés algum typo de tara...


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CENTOPÉA

Mattoso registrando: "Dos filmes que ja não pude ver, a serie de
episodios da CENTOPÉA HUMANA vem a ser o thema que mais sonnettizei. A
phantasia de Tom Six configura da forma mais grottesca a these
coprophilica de Sade, dahi a enorme repercussão viralizada do filme,
muito alem do que a midia official noticiou. Junctei os sonnettos
allusivos no livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir
na edição impressa."




GEMMAS DO CINEMA (XII) [sonnetto 4108]

Agora, no circuito americano
(Será que tambem chega ao brazileiro?),
dum filme atroz, terrivel, eu me inteiro
e o longa para manga nos dá panno.

De medico e de monstro é o caso insano,
pois liga-se uma bocca num trazeiro,
unindo trez humanos nesse inteiro
"lacraio": assim Tom Six expoz seu plano.

No chão come o primeiro e, pelo anal
canal come o segundo! Recagada
a merda é no terceiro, mais fecal!

De quattro, a "centopéa" se degrada,
rasteja, morde a bota do infernal
doutor, que a tracta a chute e chibatada!


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JOE D'ALESSANDRO

Mattoso rememorando: "Um dos filmes que marcaram a minha geração
(inclusive pelo thema musical, que virou symbolo de trilha para trepada)
foi um classico da contracultura: JE T'AIME MOI NON PLUS (no Brazil,
PAIXÃO SELVAGEM), de Serge Gainsbourg, cujo momento culminante para os
podolatras é aquella do pezão do Joe d'Alessandro na bocca da garota que
o xinga de "pédé" (pederasta), ja que elle só goza si for por traz, como
faz com os homens. Para revisitar a scena, illustro-a com um dos
sonnettos do livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir
na edição impressa."

https://www.youtube.com/watch?v=ulG5Ss1JgOY


GEMMAS DO CINEMA (V) [sonnetto 4054]

Tambem Gainsbourg achou que uma mulher,
embora seja androgyna, meresce
jogada ser da cama, si se esquece
de ter respeito ao macho, ao que elle quer.

Si não lhe obedescer, si não lhe der
o cu, seu garotão ja se emputesce.
Chamal-o de "pedê", qual si dissesse
"Brochou por que?", gorar-lhes vae o affair.

No chão, ainda o xinga. Elle lhe cala
a bocca com o pé, com o pezão
na cara, aquella lancha a admordaçal-a.

Depois, o cu lhe come: ella ja não
contesta. Admordaçada, ella se eguala,
na practica, ao pedal dum caminhão.


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ENGRAXATE

Mattoso gratificado: "Vivo citando casos poeticos de pisantes sendo
engraxados com a lingua, mas a propria TV aberta ja exhibe exemplos
litteraes como este, que thematizo nos sonnettos abbaixo, incluidos no
livro EPHEMERDAS, ainda inedito em formato impresso. Nada como a vida
real, ou pelo menos em reality, mesmo que fake..."



SONNETTO 5489 DUM MALTRAPPILHO QUE DEU BRILHO (I) (2012)

Si imagino que me tracte
com sadismo quem a bota
suja calça, um disparate
não commetto, ja se nota.

Minha lingua se debatte
entre cano e bicco, ropta
percorrida até que um vate
cego engraxe a sua quota.

Mas accerta quem adopta
outros termos e chacota
nunca faz dum engraxate...

Pois é delle o dia! Vote
no engraxate e, um dia, annote:
urnas une e em patrões batte!


SONNETTO 5490 DUM MALTRAPPILHO QUE DEU BRILHO (II) (2012)

Homenagem eu proponho
ao garoto da flanella:
o engraxate, que, em meu sonho,
eu encarno. A scena é bella:

Me obriguei, não me envergonho
de dizer, a dar naquella
bota immunda, dum medonho
bandidão, a lambidela.

Mas, na data que se presta
a saudal-o, inverto eu esta
phantasia punheteira...

Delle a gente é que o sapato
engraxar devia! Eu batto
nelle a bronha, caso queira!


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CRIMES

Mattoso reprisando mentalmente: "Alem de Kubrick, um de meus directores
predilectos é Ken Russell, não só por TOMMY mas por CRIMES DE PAIXÃO, em
que uma prostituta de dupla personalidade (China Blue, que inspirou
Angeli a crear a Mara Tara) mostra o que se deve fazer no pé do rapaz
para que elle se sinta à vontade. A scena é thema do sonnetto abbaixo,
incluido no livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir
na edição impressa."





GEMMAS DO CINEMA (VI) [sonnetto 4059]

Ken Russell, ao contrario do francez,
colloca o joven macho em posição
mais fragil, e quem lambe o seu pezão
é China Blue, a puta. Eis os porquês:

De dia, seria e sobria, o mais burguez
dos circulos frequenta. À noite, não
será jamais a mesma: seu tesão
está na perversão, na sordidez...

Transforma-se em tarada e, si um rapaz
careta a procurar, ella seu pé
descalça e no dedão boquete faz...

O cara mal consegue botar fé
naquillo que está vendo: é Satanaz
em forma de mulher, ella, não é?


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SOLAS


Mattoso recuperando: "Do tempo em que eu enxergava são estes trechos do
livro MANUAL DO PODOLATRA AMADOR. Ja na era digital, compenso a cegueira
gravando declamações em video, accompanhadas de imagens escaneadas.
Quero ver (Ops!) si algum leitor tem o pé grego e chato alludido nos
sonnettos..."

{Tudo isso me carreou reputação parallela à de poeta maldicto, que, até
ser temporariamente relegada ao limbo com a chegada da cegueira,
renderia no minimo uma bella pasta de correspondencia, volumoso
inventario de depoimentos, confidencias, propostas e phantasias. Alguns
missivistas se prendiam aos telegraphicos limites do aerogramma, onde só
uma face do papel era approveitavel. Conseguiam approveital-a ao maximo,
traçando com canneta o contorno da sola appoiada sobre a folha e
escrevendo dentro do contorno. Ommitto os nomes dos remettentes, mas as
palavras são litteraes.}

{Glauco, o que mais me excitou na entrevista (Folha-SP) foi o character
libertador, anticonsumista e antiesthetico que possibilitou a minha
acceitação do meu pé superdotado. Cada vez que você mencionava um pé em
verdadeira idolatria eu o imaginava deante dos meus dedões purulentos
com resquicios de bichos-de-pé não de todo extirpados na infancia. Me
contorci de prazer ao imaginar o fim de minhas frieiras ao contacto de
sua lingua asquerosa. Foi tão importante para mim esta acceitação da
minha autoimagem que eu vou abandonar o uso dessa litteratura
submundista que era a unica forma de extravasar meus impulsos
reprimidos.}

{Glauco, achei o maior barato sua entrevista na "Folha da Tarde". Segue
o formato e tamanho do pé, tenho os dedos com alguns pellinhos e uma
frieira no mindim, em tractamento ha 2 annos. Sou vidrado nos pés das
minhas namoradas, ellas ficam com um tesão intenso, que culmina em OMs
(orgasmos multiplos). [...] Não o achei louco maluco, te achei
liberado.}




IMPERFECCIONISTA (SONNETTO 401)
https://www.youtube.com/watch?v=wqoPIKo8RHQ

Agora lhes descrevo o pé que adoro:
Maior que o meu, portanto masculino,
ainda que pertença a algum menino,
suado até, por tudo quanto é poro.

Fedido de chulé: nunca inodoro.
Sapato ou bota: em couro nada fino.
Assim, folgado e sadico, o imagino,
egual aos que da infancia rememoro.

Mais longo o indicador que o pollegar,
na planta é plano, e não do typo cavo.
Percebem onde, emfim, quero chegar?

O pé que idealizo, beijo e lavo
na lingua, no tesão, no paladar,
é aquelle que me tracta como escravo.


SADO REPISADO (SONNETTO 3444)
https://www.youtube.com/watch?v=ksvJKvuFOE4

Dum pé sadico o formato
de explanar jamais me enfado.
Nunca é cavo: é longo e chato,
vãos nos dedos, "espalhado".

Sim, de facto, um "pé de pato",
"bicco largo" no calçado.
Esse é o thema de que eu tracto
si me humilho e me degrado.

Bem mais curto é o "pollegar",
si a medil-o alguem chegar,
do que o dedo "indicador".

Eis o molde a que, em sonnetto,
sob a sola me submetto,
seja a "prancha" de quem for.


Sobre o methodo de escripta adoptado pelo auctor, accessem:
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CHABROL


Mattoso recapitulando: "A primeira scena podomasochista que vi no cinema
foi num filme de Chabrol, UNE PARTIE DE PLAISIR (que no Brazil foi
traduzido como UMA FESTA DE PRAZER), ao qual me referi no MANUAL DO
PODOLATRA AMADOR nestes termos. O sonnetto que se segue faz parte do
livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir na edição
impressa."

{Em "Uma festa de prazer", de Claude Chabrol, a scena culminante
accontesce na beira da cama. O "macho machista", sentado, faz a "femea
feminista" adjoelhar-se no chão e manda que ella lhe lamba o pé
descalço. Apoz a primeira lambida a mulher quer parar, mas um gesto do
queixo delle mudamente ordena que continue, e a lingua dá a segunda, a
terceira, como um gattinho no prato de leite.}


Scena de Chabrol em quadro pintado:




Scena de Chabrol em site de filmes francezes:




GEMMAS DO CINEMA (IV) [sonnetto 4053]

Si, em Kubrick, o rapaz lambe um sapato
por baixo e suja a lingua no solado,
Chabrol põe a mulher, por outro lado,
lambendo o pé dum macho chucro e chato.

Posar de liberal quer, mas, de facto,
o cara é ciumento. Inconformado
ao ver que sua esposa tem passado
algum tempinho fora, diz: "Te macto!"

Da cama a joga ao chão. Descalço, manda
que lamba seu pé branco. Si ella hesita,
ordena o cara: "Lambe, mulher, anda!"

No dorso a scena mostra uma bonita
actriz passando a lingua. Menos branda
será, depois, na sola, tal desdicta.


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Contacto directo com o auctor: mattosog@gmail.com

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CASA


Mattoso repercutindo: "Muitos de meus sonnettos retractam o abuso do
cego pela molecada, mas, ao contrario do que suppõem alguns leitores,
não se tracta de hallucinação minha, muito menos de phenomeno
terceiromundista, como fica patente neste video, ao qual accrescento um
de meus sonnettos mais leves, incluido no livro DESILLUMINISMO, agora em
edição pelo sello goyano Martello."





SONNETTO GAIATO [1077]

Ouvi, quando passava na calçada:
a joven voz, sarcastica, de estalo
repicca, martellando seu badalo
prophano, gargalhando, debochada.

Risada de moleque, mas marcada
ja pelo timbre adulto. Ando e bengalo,
sabendo que dou gozo e, ao provocal-o,
me sinto reduzido a caca, a nada.

De mim falla o rapaz ao seu collega:
"Tá vendo aquelle la, cara? Que sarro!
Ficou cego! Ou tropeça, ou escorrega!"

Os dois ficam torcendo, e quasi esbarro
no poste. Sei que a mão elle até esfrega
na rola, quando atolo o pé no barro.


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BILLY

Mattoso recapitulando: "Nos annos 1990, quando eu accabava de perder
toda a visão e collaborava com o sello independente Rotten Records na
edição de collectaneas tribaes como URBANOISE, fui filmado para
videocassette lambendo a bota e o pé dum extranho trazido pelo cineasta
do trash movie, que me editou ao som dos Billy Brothers, uma das bandas
gravadas pela Rotten. Agora recuperado digitalmente, o video foi
disponibilizado na rede e eu o revisito com este sonnetto, incluido no
livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem previsão para sahir na edição
impressa."



GEMMAS DO CINEMA [I] (SONNETTO 4033)

Achou-se, emfim, o filme que commigo
foi feito annos attraz: a scena pega,
em close, minha lingua, que se esfrega
na sola duma bota, e as ordens sigo.

O actor, que a calça, entrou por ser amigo
do proprio director e meu collega
de penna, não de pena. A vista cega
não tendo, elle relaxa e eu, só, me obrigo.

A camera empunhando, o director
exige: "Passa a lingua, Glauco, passa
de novo! Agora! Assim! Sente o sabor!"

E eu raspo, na borracha, esta devassa
e grossa posta: aguento o azar, a dor,
ao passo que os dois jovens acham graça.


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sábado, 30 de julho de 2016

SOPA

Mattoso recapitulando: "Quem acha que eu exaggero ao thematizar o abuso
de cegos em meus sonnettos, provavelmente ja gargalhou assistindo a
videos de pegadinha como este, que pegam leve e levam na boa. Mas quem
quizer assistir a scenas mais pesadas demonstrando o tractamento
reservado aos cegos pela galera normovisual, basta sollicitar-me uma
admostra por email. Emquanto isso, offeresço uma admostra das pegadinhas
que ja viraram sonnetto em livros como O POETA PECCAMINOSO ou
DESILLUMINISMO. Divirtam-se!"


"Blind Man Eats Bird Poop Soup" (pegadinha)




PRANKS ON BLIND PEOPLE (X) [sonnetto 4098]

"Eu tenho aqui um 'refri', vae lhe tirar
o gosto desse liquido que o chato
jogou na sua cara..." Eis que o gaiato
retira e mostra o pau, que vae ao ar!

Mergulha o pau no coppo e dá a tomar
aquelle guaraná ao ceguinho grato,
que engole, estala os beiços: "Eu me macto,
um dia! Não supporto! É muito azar!"

Quem filma, dá risada emquanto opera
a camera, a distancia. O cego, agora,
acceita do rapaz o que lhe dera...

Tirando a bota, o cara para fora
expõe sujos artelhos, o que gera
mais risos de quem rir dum cego adora!


PRANKS ON BLIND PEOPLE (XI) [sonnetto 4099]

Dos dedos nos vãos passa elle o chiclette,
depois no pau o esfrega, antes de dal-o
ao cego, ja embrulhado, e esse regalo
mascando vae o trouxa e mais promette!

"Me contam que tem gente que commette
qualquer barbaridade (e até ja fallo
em grossa putaria), faz de rallo
humano um pobre cego, pinta o septe..."

E insiste o folgazão: "Será verdade?"
Responde o cego: "Ouvi fallar, mas não
passei por tanta coisa que degrade..."

"E nunca chupou rola?", o folgazão
insiste. "Não! Magina! Ninguem ha de
fazer isso commigo!", acha o chorão.


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PEDICURO

Mattoso recapitulando: "Outro dia foi a data do podologo, mas eu, que
nunca fui anthropologo, me considero um andropodologo honoris causa, ja
que podologuei de graça, sem precisar de cachê para performar nem de
michê para me conformar. Abbaixo vae uma scena urbana com a qual estou
accostumado na cegueira e um sonnetto pertinente. Até!"




SONNETTO PEDICURADO (740)



A planta humana é plana como um mappa
que o corpo appoia e explana, poncto a poncto.
Sem vel-a, deante della me defronto
e o rosto inteiro sinto que me tapa.

De poncta a poncta é chata como chapa.
De lado a lado é larga e, emquanto compto
centimetros, o cheiro me põe tonto
do masculo suor que a meia empappa.

Appalpo a pelle grossa e a massageio.
Lambendo lavo o vão de cada dedo.
O sujo succo sugo e amargo sei-o.

Mais grego o dedo grande, mais eu cedo
à tactil temptação de dar-lhe asseio.
Fellando, engulo a glande no arremedo.


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ENGRAXATE


Mattoso gratificado: "Vivo citando casos poeticos de pisantes sendo
engraxados com a lingua, mas a propria TV aberta ja exhibe exemplos
litteraes como este, que thematizo nos sonnettos abbaixo, um dos quaes
tambem declamado em video. Nada como a vida real, ou pelo menos em
reality, ainda que fake..."





DA LINGUA VENENOSA (SONNETTO 1321)



A lingua, ao se dobrar, mostra ser grossa,
rachada, callejada na aspereza.
Pudera! Pouco menos indefesa
está sob o solado e sob a troça!

Saliva, que ja chega a formar poça,
excorre das ranhuras. Sem surpresa,
quem lambe acha migalhas que da mesa
cahiram e adheriram, nas quaes roça.

Alem dos farellinhos, na borracha
ja gasta da botina a lingua suja
particulas communs nos pisos acha:

Poeira, cuspe, bosta e, de lambuja,
o sangue de outra lingua, menos macha
que a minha, esta que a todas sobrepuja!


HUMILDE TRABALHADOR (SONNETTO 4681)

Sentado, do engraxate, na cadeira,
um hooligan sorri, mandando: "Engraxa
ahi! Mas com a lingua!" Elle se agacha.
E os outros vendo, em volta, a brincadeira.

O velho abbaixa a cara, beija, cheira
o couro da botina. Cruel acha
aquillo, mas dos jovens, ja, bollacha
levou. Engraxará, queira ou não queira.

A lingua, sob o olhar de todos, passa
saliva na biqueira, na beirada
da sola. E os marmanjões achando graça:

"Capricha ahi, peão!" E dão risada.
Lambida a bota toda foi. Na praça,
ninguem ousa intervir, ninguem faz nada.


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FILHO

Mattoso meditando: "Si esse filho chulepento sacaneia assim o proprio
pae, imagino o que faria com um cego! Si meus leitores tambem imaginam,
peço que me enviem suas hypotheses pelo mattosog@gmail.com e retribuirei
com scenas mais explicitas, que não posso appreciar mas supponho serem
curtiveis."





SONNETTO DO BORZEGUIM DESBURGUEZADO (1204)



O couro preto enruga-se e, dos pós
que a bota ja batteu, ainda resta
um pouco accumulado em cada fresta
da sola, gasta e grossa como noz.

Biqueira arredondada e varios nós
aptados no cadarço dão a esta
especie de cothurno um ar de festa
de gala, ornando ilhoz apoz ilhoz.

Não é, porem, um reco quem a calça,
e sim um punk, o symbolo contrario
do orgulho militar. A gala é falsa.

Não marcha: pulla e chuta. De operario
é o pé, chato e calloso, que uma valsa
jamais dansou. Seu cheiro é meu themario.


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BILLY

Mattoso recapitulando: "Nos annos 1990, quando eu accabava de perder
toda a visão e collaborava com o sello independente Rotten Records na
edição de collectaneas tribaes como URBANOISE, fui filmado para
videocassette lambendo a bota e o pé dum extranho trazido pelo cineasta
de trash movie, que me editou ao som dos Billy Brothers, uma das bandas
gravadas pela Rotten. Agora recuperado digitalmente, o video foi
disponibilizado na rede e eu o revisito com dois sonnettos allusivos."





DO BORZEGUIM DESBURGUEZADO (SONNETTO 1204)


O couro preto enruga-se e, dos pós
que a bota ja batteu, ainda resta
um pouco accumulado em cada fresta
da sola, gasta e grossa como noz.

Biqueira arredondada e varios nós
aptados no cadarço dão a esta
especie de cothurno um ar de festa
de gala, ornando ilhoz apoz ilhoz.

Não é, porem, um reco quem a calça,
e sim um punk, o symbolo contrario
do orgulho militar. A gala é falsa.

Não marcha: pulla e chuta. De operario
é o pé, chato e calloso, que uma valsa
jamais dansou. Seu cheiro é meu themario.


DA BOTA QUE NÃO DESBOTA (SONNETTO 1416)


Emquanto o dum soldado é de cor preta,
do dum paraquedista, que em nó cego
passou todo o cadarço, e na sargeta
evita se sujar, eu me encarrego...

Marron, este cothurno na punheta
sonhei que lamberia, isso não nego...
Porem nunca suppuz que alguem remetta,
no bojo duma caixa, o tal burzego...

Só quando esse pacote desembrulho
e appalpo o couro gasto, quanto orgulho
calculo que seu dono delle tinha...

Da sola, 'inda o relevo sulcos guarda...
Suppondo que era verde aquella farda,
na bota passo a lingua vermelhinha...


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ASSALTO

Mattoso repercutindo: "Uma internautica amiga me contava sobre um cego
maltractado pela familia e torturado pela molecada perante a ommissão
geral, nesses interiores tupyniquins, o que me fez reflectir que a
ommissão, quando não a intenção de abusar, tudo faz parte do pacote
deshumano da humanidade, como demonstro neste video flagrado pelas
cameras de rua na Philadelphia, quando testemunhas nada fazem para
impedir que o cego seja assaltado e chutado. Si a isso sommarmos a dose
de masochismo proporcional ao natural sadismo social, teremos a formula
thematica para sonnettos como este meu, que integra o livro
DESILLUMINISMO, agora em edição do sello goyano Martello."





O CONJUGADO E O SUBJUGADO [sonnetto 3385]


Ser cego é ter, a menos, um sentido.
Ficar cego é chorar tel-o perdido.

Ser cego é superar algum limite.
Ficar cego é sentir-se rebaixado
ao cão que, outrora solto, a jaula habite.

Ser cego é compensar, tudo appalpando,
ouvindo e farejando, mais agudo.
Ficar cego é chupar, engolir tudo,
ouvir risada e as ordens de commando.

Ser cego é achar que ao cego se permitte
algum prazer. Ficar é, no solado,
lamber o pó, de alguem que, ao ver, se excite.

Ser cego é revidar. Eu não revido.
Fiquei, pois: levo o chute e nunca aggrido.


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ARANHA

Mattoso horrorizado: "Pedi aos leitores que me escrevessem para sacanear
um cego, mas um delles me enviou um video que mostra um vendado aptado a
uma cadeira para, como me foi descripto por quem assistiu, ser exposto a
uma... aranha! Soccorro! Aqui vae o video, seguido de sonnetto allusivo.
Tirem esse bicho dahi!"



ARACHNOPHOBIA (SONNETTO 3874)



Dellas fallo francamente
e pavor ellas me dão.
Mas conhesço muita gente
que não falla dellas, não.

Quer testar? Experimente
commentar sobre o ferrão,
as cheliceras, na frente
de quem tenha essa adversão.

Falle em como é cabelluda
a mygala e como gruda
numa victima, ao piccal-a...

O subjeito fica mudo
de terror, o que diz tudo:
mais exprime quem não falla...


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AMIGO

Mattoso endossando: "Esse cara que performa o Blind Guy pisa no callo e
põe o dedo na ferida. Mas os melhores amigos do cego são aquelles que o
sacaneiam consensualmente. Wilma Azevedo que o diga. Retractei diversas
dessas situações, inclusive as dissensuaes, no livro DESILLUMINISMO,
lançado no dia 10 de Agosto (19 horas) na Livraria da Villa da Fradique.
Não vejo vocês la! Apparesçam!"




SONNETTO "A MISSÃO DO CEGO"



Perguntou Wilma Azevedo,
ao rever-me, si é verdade
que, ja cego, eu sirvo e cedo
aos caprichos dalgum Sade.

Respondi que meu degredo,
na cegueira, ou minha grade,
é servir como brinquedo
delle e ser o que lhe aggrade.

"E esses Sades, Glauco? São
mesmo sadicos? Tesão
sentem vendo um cego em pranto?"

"Você sabe, Wilma: quem
tem visão quer rir de alguem
que feliz não seja tanto..."


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ALEX

Mattoso visualizando: "Do cinephilo que fui emquanto enxergava, a
memoria guarda como scena suprema aquella do Alex lambendo sola em
LARANJA MECHANICA, aqui copiada. Approveito para transcrever um sonnetto
allusivo, incluido no livro O CINEPHILO ECLECTICO, ainda sem edição
impressa. Saudações orthographicas!"




GEMMAS DO CINEMA (III) [sonnetto 4052]

A scena culminante, em close, é aquella
de Kubrick, em que o joven delinquente
que fora, outrora, algoz de tanta gente,
agora, na prisão, supplica e appella.

Será disciplinado: sae da cella
directo para um palco, onde consente,
na marra, que um subjeito o aggrida e tente
fazel-o reagir. Que occupa a tela?

Cahido, Alex, de cara para cyma,
é visto de perfil, emquanto a sola
lhe cobre a bocca: ha pé que mais opprima?

Com ordem de lamber, Alex exfolla
a lingua, que se dobra e se approxima
dum humido capacho: humilde eschola!


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sábado, 30 de abril de 2016

7 DE MAIO/2016: DIA DO SILENCIO


Muito ja me queixei da falta de silencio, principalmente durante as
madrugadas, quando balladeiros e caçambeiros, lixeiros e baderneiros
perturbam minhas infructiferas tentativas de debellar a insomnia, para a
qual certamente contribuem outros factores (inclusive a propria
cegueira), mas que podia ser combattida com alguma efficacia si as
noites paulistanas não fossem tão barulhentas. Ja tive opportunidade de
enaltescer o silencio em prosa e verso, mas agora quero fallar dos
momentos em que não sinto falta do silencio ou, pelo contrario, é o
silencio que me faz sentir falta de algo. Melhor dizendo, de alguem, ja
que a presença do meu cachorro se traduz em ruidosa sonoplastia:
lattidos, correria, vozes (minha e de Akira) chamando, ralhando ou
rindo... tudo por compta do nosso bassetudo mascotte que, como todos
sabem, se chama Chicho.


Meus pingados leitores tambem ja foram appresentados a Jorge e Salomão,
respectivamente o dono e seu basset, mais conhescido como Salô. Nossa
amizade com aquelle vizinho sessentão vem se estreitando à medida que
virou habito domingueiro levar Salô e Chicho ao "cachorrodromo" do
Ibirapuera. Mas Jorge, que fica todo embevescido com a chance de tutelar
dois salsichudos e vel-os brincar como dois colleguinhas de eschola na
hora do recreio, não se contenta com leval-os e trazel-os de carro: na
volta do parque, deixa-os à vontade dentro de casa (um sobradão com
quintal arborizado, desses typicos aqui da Villa Mariana) e, alem de
lhes offerescer petiscos de todo typo e a toda hora, lhes estimula a
vocação vocal, abrindo-lhes o piano da sala e convidando-os a cantar e
tocar até o fim da tarde. Alguem extranhou? Calma, que tudo tem
explicação.


Sabe-se que, com um pouquinho de encorajamento, a bassezada se desinhibe
e accaba dando show de interpretação, caso da famosa Lucy, estrella do
cyberespaço, cujo solo agguarda apenas um apito para brilhar mundo
affora. Aqui vae a scena immortal:





Claro que, tal como a creançada, os hounds se soltam mais quando teem
companhia, caso do trio vocal que, incentivado pelo uivo humano do
"maestro" que dirige a scena, performa um khoro de causar inveja aos
trez tenores mais populares da historia. Segue a sessão anthologica:





Talento mais raro é o dos orelhudos que se accompanham ao piano, pois
sua carreira artistica exige mais ensaio e affinação. No primeiro caso,
o pianista demonstra sua capacidade de improvisar, mas é Tommy, o grande
idolo do publico audiovisual, quem arrasa com seu perfeito senso de
rhythmo e de melodia. Eis seu maior successo nas paradas do
"canicioneiro" internacional, logo em seguida à appresentação do
improvisador:







Pois não é que Jorjão, encerrando o lanche e accenando com mais
biscoitos depois do sarau, convida Salô e Chicho a uma audição
pianistica, seguida de exercicios individuaes ou em duetto? Primeiro,
elle se senta e toca uma sonata de Scarlatti, ou algo que lembre aquella
sonoridade barroca. Descomptado o amadorismo, até que elle obtem
approvação da dupla que, obviamente, não applaude apenas para aggradar
ao amphitryão que os banqueteia. Encerrado o primeiro numero, chega a
vez de Salô, mais accostumado ao teclado. Por ultimo, Chicho tem seu
momento de gloria, exhibindo ao amigo e ao dono da casa os mais bellos
accordes que uma torta pattola e um tymbre lyricamente grave são capazes
de harmonizar ao ouvido humano.


Emquanto Jorge se emociona quasi até às lagrymas com o khoro
"cãomeristico" (como elle trocadilha), eu quasi não contenho meu choro
de saudade, impaciente com a demora do interphone em annunciar o retorno
do meu fofo campeão, todinho marron e marrento. Affinal Chicho é
devolvido ao nosso convivio e, ainda excitado pelo dia de folia,
percorre todo o appartamento, correndo e lattindo para affugentar
qualquer mariposa intrusa que, como os passarinhos diurnos, possa
invadir seu territorio.


Emfim a casa echoa sons de animação e vida, pondo fim à tarde dominical
que, a despeito dos torcedores que gritam, xingam ou cantarolam la fora,
me paresce tão quieta a poncto de calar no espirito a impressão de
silencio absoluto...


Akira tambem retornou de seu passeio costumeiro e, agora, nós trez
fazemos da cozinha o poncto de encontro da familia. Chicho nos observa
emquanto jantamos, comportadamente sentado nas pattas de traz, farejando
o ar à espera duma lasquinha de presuncto ou duma bituquinha de
linguiça. Em casa de Jorge, elle se sente à vontade para seguir o mau
exemplo do Salô, que tem liberdade até para appoiar as pattas deanteiras
na coxa de quem se senta à mesa, a fim de ganhar pedaços dados na bocca,
mas aqui em casa Chicho sabe que tem regras e permanesce sentadinho e
affastado da minha cadeira emquanto eu e Akira nos servimos. Ja fui
franco e fallei que Salô está muito mal accostumado, precisando de
disciplina mais rigida, mas a resposta do Jorjão é sempre a mesma: "Ah,
coitado!..." Só uma vez, em logar de entregar Chicho aos cuidados do
Jorge, acceitei ficar com os dois bassets no apê, mas foi o que bastou
para entender quanta bagunça ambos appromptam junctos e quão
malcomportado é o mais joven amigo pretão do meu moleque marronzão.
Quando Salô quiz fazer minha coxa de degrau na hora da janta,
segurei-lhe a pattola e disse: "Salôôô! Vocêêê, querendo subir em mim
com ESTA pattola?" Elle reagiu como todo basset quando lhe pegam na
patta: puxou-a e desceu. Tentou de novo e repeti o gesto, até que
percebesse a differença de permissividade e se collocasse ao lado do
Chicho, agguardando sentado que eu jogasse algo no chão. Outra hora
contarei mais mammatas que Chicho não tem e Salô desfructa da mão do
dono.


Quem não tem cachorro e leu até aqui deve estar pensando: "Mas a troco
de que toda essa papparicação dum bicho de estimação? Qual a implicação
disso na historia litteraria ou na harmonia universal?" Não, não se
tracta meramente de reflectir sobre o ambiente silencioso ou ruidoso
conforme a solidão ou a companhia do momento. Tampouco de conjecturar
sobre o immutavel mutismo kosmico, quer sob a optica physica, quer sob a
metaphysica. Talvez devessemos enquadrar o silencio sob um olhar mais
"quantico", a partir duma percepção, não digo extrasensorial, mas
synesthesica. A philosophia que está por traz do silencio é a mesma que
está por traz das trevas. No silencio, a memoria auditiva funcciona para
que sintamos falta dos ruidos aos quaes estamos accostumados; na
escuridão, é a memoria visual que preenche a lacuna. Dahi se deprehende
que o silencio seria a saudade do som, tanto quanto a escuridão seria a
saudade da imagem. Por outras palavras, o silencio equivale à surdez,
como a escuridão à cegueira. Tudo bem, um silencio temporario é mesmo
repousante, tal como uma luz apagada é necessaria ao somno. Mas ninguem
desejaria um silencio eterno nem perpetuas trevas, a menos que tenha
perdido o amor pela vida. Em ultima analyse, que significa amor à vida?
Talvez amor às outras vidas que convivem com a nossa vida e amenizam a
sensação (ou o sentimento) de solidão. Precisamos de companhia tanto
quanto precisamos ver e ouvir aquelles que nos accompanham. Claro que
passar uma noite em claro nos impacienta, especialmente quando a
insomnia é causada pela barulheira da vizinhança. Mas peor que isso é
admanhescer sem ninguem a nosso lado, sem outra pessoa ou sem um
cachorro, por exemplo. Akira e Chicho representam mais que presenças
physicas: são signaes vitaes reciprocos, de que existimos um para o
outro. No meu caso, si não posso vel-os, posso ouvil-os e tocal-os,
donde a saudade de suas vozes, na ausencia delles, ja que suas figuras
não me são perceptiveis. Em summa, silencio é saudade. Portanto,
silencio não pode ser synonymo de eternidade, mas apenas de espera e de
paciencia, como quando agguardo a volta do Chicho ou do Akira, que
sahiram a passear e me deixaram aqui viajando mentalmente. Para remactar
a philosophia do silencio, transcrevo o sonnetto cujo video abriu esta
chronica.



SONNETTO FAREJADO (624)


Bassê no appartamento fuça em tudo!
Passeia pela sala e faz lambança
no pé dos moveis, maximo que alcança
um corpo tão comprido e salsichudo...


Ja li de especialistas um estudo
provando que o bassê, mais que a creança,
precisa bagunçar, e só se admansa
com beijo. Então, do meu nunca desgrudo.


Commigo no sofá, tambem cochila;
só falta, à mesa, usar o mesmo prato;
na cama nossa noite é bem tranquilla.


Extranham que ao cão como gente tracto?
Pois saibam que até cocker, collie e fila
me lattem dos vizinhos! E eu lhes latto!



///

sábado, 2 de abril de 2016

8 DE ABRIL/2016: DIA DO BRAILLE



8 DE ABRIL/2016: DIA DO BRAILLE
16 DE ABRIL/2016: DIA DA VOZ


UMA FASCINANTE OFFICINA FESCENNINA


[1] Alli pelo final dos annos septenta, quando eu editava o poezine
JORNAL DOBRABIL ainda em folhas soltas dactylographadas e xerocopiadas,
Augusto de Campos me incentivava e, ao contrario do que se possa suppor
dum apollineo poeta concretista, compartilhava meu dionysiaco
enthusiasmo pela poesia fescennina. A fim de supprir o JD com material
de que eu não dispunha, Augusto não só cedeu-me um sonnetto que
traduzira de Giuseppe Belli como emprestou-me livros difficeis de achar
por aqui, a exemplo da ANTHOLOGIA DE POESIA PORTUGUEZA EROTICA E
SATYRICA: DOS CANCIONEIROS MEDIEVAES À ACTUALIDADE, organizada por
Natalia Correa, que hoje está bem reeditada e disponivel.
Comprehensivelmente, não tinhamos obra similar que inventariasse o
turpiloquente legado tupyniquim. Só quando, ja cego e sonnettista, eu
entrava pelo novo seculo a publicar minha propria lyra pornosiana, foi
que sahiu a ANTHOLOGIA PORNOGRAPHICA de Alexei Bueno, parcialmente
abrangente para os dois lados do Atlantico. Seria preciso agguardar mais
uma decada até que viesse à luz a monumental empreitada de Eliane Robert
Moraes, ANTHOLOGIA DA POESIA EROTICA BRAZILEIRA, a mais exhaustiva e
investigativa, que só pecca pela ommissão de alguns representantes da
chamada "poesia de bordel" (repentistas, glosadores e chordelistas que
povoam a cantoria popular nordestina) ou dos representantes oitentistas
do MAP (Movimento de Arte Pornô): Eduardo Kac, Cairo Trindade e outros
inicialmente anthologiados por Leila Miccolis, ella propria ja
reconhescida, à epocha, como madura auctora duma visceral e virulenta
poesia feminina. A despeito de taes ommissões, a compilação da
professora Eliane alcança a geração de Roberto Piva e a minha mesma,
contemporaneos que somos da miccolissima Leilinha. Uma das virtudes da
obra, outrosim, foi a inclusão de dois poetas satyricamente homosexuaes
que, sem pretensões academicas nem editoriaes, compuzeram e compilaram a
varias mãos e masturbações uma collectiva collectanea intitulada
CANTHARIDAS. Assim os situou Oscar Gama Filho na appresentação do livro
publicado em 1985:


{Paulo de Tarso Vellozo e Guilherme Sanctos Neves foram os responsaveis
pela sua concepção, montagem, dactylographia e redacção. Com fins
satyricos, porem, attribuiam a outros a auctoria dos artigos e dos
poemas. O sonnetto "Vinte e quattro..." refere-se à coincidencia entre
duas datas: Jayme Sanctos Neves, o satyrizado, que nascera no dia 24,
estava completando vinte e quattro annos. Como Jayme veiu ao mundo em
1909, esse texto só pode ter sido produzido em 1933. Portanto, 1933 fica
estabelescido como anno-base para a creação de CANTHARIDAS.}


Esses trez nomes, identificados pelas iniciaes P, G e J, assignam
dezenas de sonnettos, dentre os quaes seleccionei os que aqui commento.
Tenha-se em mente que, na primeira metade do seculo passado, a
iniciativa daquella dupla de intellectuaes era clandestina e arriscada a
comprometter o futuro profissional de cada um que adherisse ao abjecto
projecto, quer fosse a carreira medica, quer fosse juridica ou
pedagogica. Foram elles, portanto, mais corajosos que eu, quando comecei
a explicitar minhas adventuras erotico-poeticas em pleno regime
dictatorial post-1964. Eis como os retracta (disfarsando-os de
nordestinos) outro parceiro de licenciosidades, appellidado Lapis,
Lapisu ou Lapisuinha, quebrando o pé do quarto verso mas quebrando
tambem quaesquer reservas de singello sigillo, lembrando que seria
suppostamente de Vellozo (natural de Victoria, Espirito Sancto) a
auctoria de varios sonnettos assignados por outros membros da tertullia:



OS TREZ FRESCOS DE ALAGOAS [L]


Guilherme, Paulo e Jayme, trez bandalhos,
Putanheiros terriveis, sem eguaes,
Em vez de abboccanharem bons caralhos
Vivem a fazer sonnettos immoraes. [hendecasyllabo]


Guilherme, ja velhote, é bem matreiro,
Bolina até veados, no cinema.
Nas horas vagas, consta que é padeiro,
Recebe patos do Francisco Gemma.


O Paulo quer ser puto e muito sente
Não poder engolir grossa bichoca,
Pois o kysto do cu fica na frente...


O Jayme, que tem sempre o pau bem rijo,
De uma menina, percebendo a toca,
Metteu o dedo-sonda... e tirou mijo!



Quanto ao sonnetto referido por Gama Filho, é o que se segue, annotado
na edição em livro como parodico dum sonnetto bocageano que alguns
attribuem a João Vicente Pimentel Maldonado, cujos versos iniciaes
dizem: "Não lamentes, ó Nize, o teu estado; / Puta tem sido muita gente
boa;". Logicamente, nem Bocage, nem Maldonado teriam commettido as
catalexes e dysrhythmias que assignalo e, mais addeante, apponcto em
outros casos.



VINTE E QUATTRO... [P]


Não lamentes, ó Jayme, o teu tormento,
Puto tem sido muito cabra forte;
E, mesmo, a data do teu nascimento [dysrhythmico]
Te obriga a ser veado até a morte!


A tua bunda, o teu andar dengoso,
Teu triste palavrorio dissoluto,
Faziam-me pensar: "Paulo Vellozo,
Será que o teu amigo Jayme é puto?"


Dobrando o vinte e quattro, estás fagueiro,
E deante de tal coincidencia,
Accredito que és mesmo bundeiro... [enneasyllabo]


E ahi é que a cousa se estrombica, [enneasyllabo]
Pois conhescendo ja tua tendencia,
Só posso dar-te, de presente, a picca...



[2] Naquella phase septentista e dobrabilesca meus versos, comquanto
escatologicos, pautavam-se pelo librismo marioswaldiano, pelo
colloquialismo marginal e pelo graphismo concreto. Minha attitude em
relação ao sonnetto era a do admirador parodista e do leigo iconoclasta.
Dahi que, em 1985, quando o DOBRABIL ja tinha virado livro e virado a
pagina, me maravilhei ante a publicação do volume das CANTHARIDAS E
OUTROS POEMAS FESCENNINOS pelo sello paulistano Max Limonad: aquelles
sonnettos homoeroticos, a um tempo classicistas pela forma e
contraculturaes pela ousadia libertina/libertaria, configuravam, ao meu
olhar, tudo quanto eu almejaria compor caso fosse eximio practicante do
genero e unisse a putaria mais escancarada ao mais fechado rigor
estichologico. Tive, então, a mesma impressão registrada por Reynaldo
Sanctos Neves (renomado escriptor e filho de Guilherme) na orelha do
livro, quanto ao quesito qualitativo:


{Embora seja eu quem o diga, e sou suspeito, tendo ouvido muitos desses
poemas quasi desde o berço [...] é só abrir uma pagina a esmo e ler.
Veja que são poemas (em sua maioria sonnettos) extraordinarios tanto em
seu aspecto formal como em sua imagistica original e escabrosa, em sua
linguagem rica e irreverente, salpiccada de saborosos palavrões hoje em
desuso, poemas que ainda se characterizam por um fio conductor que,
conforme assignala Oscar Gama Filho em sua appresentação, accaba dando
um toque de romance à obra como um todo.}


Sigamos a suggestão de Reynaldo e folheemos ao acaso para acquilatar a
validade de suas palavras. O sonnetto abbaixo apparenta guardar as
characteristicas mencionadas. Sinão, vejamos:



CURUBA [J]


Chegou-se a mim, o puto, e sem ter pejo
Escorregou-me a mão pela virilha,
Fingindo procurar um percevejo;
E, pouco a pouco, abriu-me a barriguilha.


Puxou-me para fora o p'ra-ti-leve
E cocegas me fez co'a leve mão.
Depois, entremostrou-me o cu de neve
E o rosado perfil do seu bujão.


Pegou-me, do caralho, no gargalo,
E uma pivia mascou-me, à Ruy Barbosa...
Mas sentindo, do cu, coçar o callo,


Elle teve uma idéa genial:
Deixou ficar em meio a gloriosa,
E fez do meu caralho - Mitigal!



À parte a necessidade de notas para explicar que uma "pivia à Ruy
Barbosa" seria uma "masturbação complementada pelo gesto de passar uma
das mãos sobre a glande" e que Mitigal seria uma "pomada para alliviar a
coceira", fica patente o colorido da linguagem, que emprega expressões
bem castiças em meio a outras mais debochadas, como "barriguilha" em
logar de "braguilha", "p'ra-ti-leve" em logar de penis, alem de "bujão",
"gargalo", "mascar" e "gloriosa". Sem duvida, um quadro de obra-prima
para retractar a scena masturbatoria, que se emmoldura pela correcta
composição dos decasyllabos, equilibrando heroicos classicos e martellos
aggalopados, remactados por rhymas que, si não são ricas, são felizes,
entre versos agudos e graves, tudo em perfeita proporção. Vale
accrescentar o que vae annotado na edição de 1985, procedimento que
farei doravante, sempre entre chaves, nas demais transcripções: {De
Jayme para Paulo, a se considerar o "callo" do verso onze como uma
referencia ao seu famoso kysto. "Curuba" é, segundo o Aurelio, uma
"pequena pustula pruriginosa", o que justifica a tirada do fecho do
poema.}


[3] Claro que, pela minha optica erotica, a veia viciosa dos vates
victorienses emphatizava demais a sodomia em detrimento da pederastia,
ou, para empregar uma concepção menos hellenistica, privilegiava a
penetração anal emquanto minimizava o papel do sexo oral, a mim tão caro
e autobiographico. Fetichismo e sadomasochismo, mais autobiographicos
ainda, eu nem esperava encontrar naquelle repertorio de epigrammas
reciprocamente sonnettados e compartilhados em saraus entre amigos, num
circulo privado e ambientado na capital capixaba dos annos trinta em
deante.


Seria pedir demais que um unico verso delles alludisse à podolatria, mas
a escassez de scenas de fellação me deixou um tanto desapponctado. Não
obstante, a consistencia litteraria e o pioneirismo thematico de tal
obra não me incutiam duvidas accerca da sua importancia historica. Agora
que Eliane Moraes as resgatou em sua anthologia, occorreu-me revisitar
as CANTHARIDAS, que coincidentemente voltaram às minhas mãos num
surradissimo exemplar presenteado pelo cearense Sylvio Sanctos, meu
collega de Academia Canindeense, depois que duas mudanças extraviaram
parte da bibliotheca na qual se achava meu exemplar original.


A escassez a que me refiro somente se exceptua em casos oralistas como
estes abbaixo, francamente "concedidos" em meio a tanta enrabação.
Assignalei duas quebras de pé, uma para menos, outra para mais, do
parametro decasyllabo, sendo que o verso claudicantemente alexandrino
poderia adjustar-se si fosse redigido assim, às custas duma apherese e
duma ecthlipse: "Emfim, va la! - Não 'stás co'esquentamento?":



ARCO-IRIS [P/J/G]


[P] Attracado ao manzarpo do Ramalho,
[J] O Nino, sob os raios violeta,
[J] Arreganhando o rubronegro talho,
[G] Chupa-o com gosto, qual rosada teta.


[G] Emquanto chupa o advermelhado malho,
[P] Rebolla o alvo cu do sacaneta, [enneasyllabo]
[J] E o atrophiado e pallido caralho
[P] Murcho balança, à mingua de punheta.


[J] A do Ramalho, furtacor bichoca,
[G] Se intumesce, ja roxa de tesão,
[P] E a cabeça azulada quasi poca...


[P] Vendo a coisa ja preta pro peru,
[J] Ramalho, p'ra evitar uma explosão,
[P] Abbafa a piça no irisado cu!



{Amigo intimo dos auctores e medico, não excappa o Nino de protagonizar
esta comedia, fazendo papel de homosexual passivo às voltas com um
collega medico, o Ramalho. A adjectivação do sonnetto é toda ella
constituida de termos relativos a cores, appresentados em grypho no
original.}



O QUE ELLE NÃO CONTOU... [J]


Foi na Praia da Costa, attraz do Lucio:
Eu estava enxugando a gran-caceta
E puxara p'ra traz o meu prepucio,
Descobrindo, do pau, a maçaneta,


Quando o fresco Tarsinho, que commigo
Mudava a roupa e tambem 'stava nu,
Vendo-me o pé-de-porco sob o umbigo,
Sentiu negra e feroz tesão de cu.


Fingindo procurar alguma cousa,
Logo s'agacha sobre o meu caralho
E a beiçola sedenta nelle pousa.


Com phrenesi, chupou-me a porra immunda,
E tão perfeito foi o seu trabalho,
Que nem pude, depois, comer-lhe a bunda.



{Replica de Jayme, refazendo a farsa à sua maneira e, logicamente,
invertendo toda a sua optica satyrica. O Lucio era como se chamava um
bar na Praia da Costa, cujo banheiro, nos fundos do quintal, era usado
para trocarem de roupa.}



TESUINA [P]


"Larga-me o pau! Não brinca! Ora que porra!
Assim não, que m'arranhas, Lapisu!
Não podes mais me ver a gran-pichorra,
Sem ter vontade de enfial-a ao cu?


Não fodo! Ja te disse que não fodo,
Pois me deixas o pau sempre cagado!
Não chupa, Lapisu! Que o mellas todo...
Deixa o puto do nabo sossegado!


Não me lamba os colhões! Eu sou cosquento...
Tu pensas que os meus ovos são jujuba?...
Emfim, va la! - Não estás com esquentamento? [alexandrino]


Deixa-me ver... - Que bunda magra e lisa!
Puta que o merda! Mas quanta curuba?!
Não, Lapisu! Só fodo com camisa...



{Volta Paulo a satyrizar Lapisuinha, para não perder o habito,
appresentando-o mais uma vez como homosexual passivo insistente e até
inconveniente em suas tentativas de seducção. O sonnetto se distingue
dos demais por sua estructura em forma de dialogo.}



[4] Foi divertido saborear novamente aquelle "fanchonismo"
thematico-estylistico que muitos tomariam, hoje, por anachronico e
hermetico, mas, agora que os leio com os ouvidos e não mais com os
olhos, os sonnettos de CANTHARIDAS ja não se me affiguram tão
modellares. Depois de compor milhares do typo e de elaborar um tractado
de versificação, estou mais attento aos tropeços e cochilos, a começar
pelos meus proprios. Logo, posso apponctar vicios dos quaes tambem
padesci e que hoje evito, o que não desmeresce os exemplos que ora
transcrevo e reorthographo. O tropeço mais flagrante é o metrico, do
qual, por signal, não excappou o proprio Paulo Vellozo ao fingir que
criticava versos alheios, incorrendo, elle proprio, na "metragem manca"
que imputava aos confrades, como no exemplo abbaixo, este sim,
metricamente correcto:



MERDORRHÉA [P]


Ah Gordo! Si te pego em Pau Gigante,
Si pudesse algum dia aqui te ver,
Tal bichocada dava-te ao cagante
Que nunca mais cagavas com prazer...


Si eu te pegasse aqui, Gordo maroto,
Co'a tua pudicissima regueira,
Havia de fazel-a, Gordo escroto,
Transformar-se em babaca de rampeira.


Os teus quattorze versos são um mixto
De fedentina e putaria franca,
Diffamando o meu nobre e roseo kysto.


Emfim, comtigo, nunca mais me metto,
Pois são teus versos, de metragem manca,
Caudaes de merda, à guisa de sonnetto.



{Replica de Paulo, que na occasião andava por Pau Gigante, ao sonnetto
XLI, de Jayme, a quem tracta por "Gordo". Note-se, no fecho do poema,
mais um exemplo de satyra coprologica ao fazer poetico alheio.}



[5] Quanto ao tal "nobre kysto" do qual Vellozo se vangloriava,
tracta-se do mais original e caricatural "personagem prosopopaico" do
livro, motivo das maiores gozações accerca daquelle rectal obstaculo às
penetrações obsessivamente practicadas pelos actores/auctores. A
referida excrescencia characteriza typico caso de metonymia (mais
precisamente, de synecdoche, figura que explanei no livro POESIA
QUESTIONADA), similar à minha fixação no pé que symboliza o sadismo e a
oppressão do mais forte sobre sua victima. No caso, a symbologia reside
na sodomia como peccaminosa e delictuosa perversão em tempos ainda muito
puritanos para que se admittisse abertamente uma abertura anal tão...
profunda.


Eis uma sequencia de sonnettos nos quaes o celebre kysto se immortaliza
na penna dos parceiros de Vellozo (si não do proprio), resalvados os
versos de pé quebrado e o emprego do termo "tesão" no feminino, uma
troca de generos mais corrente naquella epocha do que na actualidade,
bem como relevados devem ser os versos dysrhythmicos, isto é, que não se
encaixam nos metros heroicos (puro, impuro ou martello aggalopado), nem
no metro sapphico, normaes padrões do decasyllabo:



O SACANAZ [J]


Dizem ahi que um tal Paulo Vellozo, [heroico impuro]
Putanheiro maior que tenho visto, [martello]
Vate capenga, alem de malcheiroso, [heroico impuro]
Tem na prega do cu seboso kysto. [martello]


Amante de tesudos garanhões, [heroico puro]
E conhescido lambedor de connas, [sapphico]
Vivia sempre a esvaziar colhões [sapphico]
De libidinosissimos fanchonas. [heroico impuro]


A historia do seu kysto é bem immunda: [heroico puro]
Estrepou-se o coitado, dando a bunda, [martello]
A quem tinha, a foder, serrano pau. [martello]


E a tenção lhe ficou de, em toda a vida, [martello]
Fechar o cu a piça tão fornida, [heroico puro]
Entrar para um convento e ser vestal! [heroico puro]



{Eis que surge Jayme em sua primeira (não comptando a Homenagem)
contribuição a CANTHARIDAS, pondo em relevo o kysto que Paulo teria no
anus, e que se tornará um dos themas favoritos da collectanea. Aqui
Jayme estabelesce tambem, cabalmente, a linha satyrica que vae
preponderar ao longo da obra, ou seja, a characterização burlesca de
cada um e de todos como si fossem putanheiros militantes, adeptos
sobretudo de practicas homosexuaes. No primeiro tercetto Jayme
appresenta, dentro dessa linha, uma explicação para a origem do tal
kysto. Na gravação de 29 de septembro de 1974, aliaz, Paulo desmente até
a existencia do kysto. "Não é kysto. É o coccyx. É o meu coccyx, que é
mais prolongado." A clausula "a quem tinha, a foder, serrano pau"
refere-se a um certo Jurandy, morador da Serra, municipio vizinho de
Victoria, que passava por ter um membro advantajado e que, graças a
isso, volta e meia reapparescerá nos sonnettos.}



EMPATA-FODA [J]


Redondo cu a palpitar fogoso, [sapphico]
Em meio a um bujão gordo e rosado, [enneasyllabo]
Tinha um pello macio e bem sedoso, [martello]
Em volta ao caprichoso pregueado. [heroico puro]


Tal o cu que um dia eu quiz comer, [enneasyllabo]
Arrectado qual frade garanhão, [martello]
E co'o caralho duro e a tremer [enneasyllabo]
De justificadissima tesão. [heroico impuro]


Minha bichoca entrava docemente [heroico impuro]
Pela mucosa quente, deslisando, [heroico impuro]
Quando batte um caroço de repente! [martello]


Não posso me conter: "Paulo, que é isto?" [heroico puro]
E elle, ainda de gozo se babando: [martello]
"Não se incommode, não, é o meu kysto..." [enneasyllabo]



SEU RABO [G]


Ó cu insaciavel! Ó cu guloso! [dysrhythmico]
Cu Leonidino! Cu Mariquinheiro! [heroico impuro]
Que só pensa no torpe e sujo gozo [martello]
Do seu dono, safado e putanheiro! [martello]


Olhe aqui, Paulo de Tarso Vellozo: [dysrhythmico]
Dê modos ao seu cu, ao seu trazeiro, [heroico puro]
Que quando picca vê, fica dengoso, [heroico puro]
Abre-fechando, todo prazenteiro... [heroico impuro]


Diga-lhe que se contente com o pisto [dysrhythmico]
A que você, prudente, chama kysto, [heroico impuro]
Escondendo aquella origem infamante! [hendecasyllabo]


E si elle não se der por satisfeito, [heroico puro]
Dizendo-se buraco pouco estreito, [heroico puro]
Enterre-lhe na prega o Pau Gigante! [heroico puro]



{Guilherme contra Paulo, seguindo a mesma linha gaiata a que ja nos
habituamos. Os adjectivos do verso 2 ("Leonidino" e "Mariquinheiro")
foram cunhados a partir dos nomes de conhescidos homosexuaes da epocha,
Leonidas Resemini e Mariquinhas. O primeiro tercetto e o verso final
repisam mais uma vez elementos ja tradicionaes na obra, como o kysto de
Paulo e a commarca de Pau Gigante, onde era promotor.}



PREVIDENCIA [J]


Emquanto agguardo o sonnetto immundo [enneasyllabo]
Que o teu seboso kysto vae parir, [heroico puro]
Fico abysmado num pensar profundo, [sapphico]
A cogitar em que é que vaes bullir. [heroico impuro]


Talvez a tua Musa putanheira [heroico puro]
Tome por mira ou tome por baliza [heroico impuro]
A minha pudicissima regueira, [heroico puro]
Que até para cagar se ruboriza. [heroico puro]


Talvez, ó Musa infame e meretriz! [heroico puro]
Mexas co'a voz amena do seu Zuza [heroico impuro]
Ou co'o recto perfil do meu nariz... [martello]


P'ra te evitar essa prenhez excusa, [sapphico]
Eu, antes que tu cagues o sonnetto, [heroico puro]
No teu redondo cu o pau te metto... [heroico puro]



{Curioso sonnetto em que Jayme se antecipa à satyra que agguarda de
Paulo, ja prevendo acchincalhes ao jeito do sonnetto XXXIV. O espirito
altamente ironico de CANTHARIDAS transparesce muito vivido nos versos 10
e 11 deste sonnetto, em que Jayme se refere à "voz amena do seu Zuza",
que era fanhoso, e ao "recto perfil do meu nariz", que era - e é -
grande e curvo como o de um judeu.}



[6] O proprio portador do kysto immortal delle se jacta, sem perder
opportunidade de exhibir sua erudição, uma vez que parodiava Bocage (ou
o Abbade de Jazente, segundo alguns contestadores da authenticidade
bocageana), cujo sonnetto analysei no livro DESBOCCADOS E CABELLUDOS e
copio mais abbaixo. Aliaz, era commum entre os cantadores cantores das
CANTHARIDAS as parodias, como exemplifico no topico seguinte.



CAGADAS [P]


Placidamente numa moita estava
Cagando ao vento, uma cagada farta!
E no momento em que o bujão limpava,
Chegou-me a tua fedorenta charta.


Depois de lel-a toda, é que notei
Que tinha, ainda, o kysto engordurado.
Servi-me, então, da charta, e me vinguei
Passando-a no logar mais adequado...


Depois, antes de as calças levantar,
Foi que vi a segunda producção;
E como não queria mais cagar


Nem deixar sem resposta a tua Musa,
Abri as pernas e, com devoção, [dysrhythmico]
Peidei para você e para o Zuza.



{Residindo em Pau Gigante nessa occasião, Paulo teria recebido pelo
correio ("Chegou-me a tua fedorenta charta") os sonnettos XLI e XLII de
Jayme, aos quaes replicou com este e o anterior. Tudo leva a crer que a
"segunda producção" (verso 10) se refira ao sonnetto XLII, o que
auctorizaria então identificar-se como Paulo o "sagaz advogado" de que
se tracta alli. No final, como vinha occorrendo geralmente nos sonnettos
de Paulo, sobra uma ferroada tambem para o Zuza, parente de Jayme.}



[SONNETTO PARODIADO] [Bocage]


Cagando estava a dama mais formosa,
E nunca se viu cu de tanta alvura;
Porem o ver cagar a formosura
Mette nojo à vontade mais gulosa!


Ella a massa expulsou fedentinosa
Com algum custo, porque estava dura;
Uma charta d'amor de allimpadura
Serviu àquella parte malcheirosa:


Ora mandem à moça mais bonita
Um escripto d'amor que lisonjeiro
Affectos move, corações incita:


Para o ir ver servir de reposteiro
À porta, onde o fedor, e a trampa habita,
Do sombrio palacio do alcatreiro!



[7] Alem de Bocage, foram referenciaes à satyra velloziana Camões, Bilac
e Raymundo Correa, por exemplo. Outro exemplo de sonnetto parodico é
este, homonymo do original de Augusto dos Anjos, que requer transcripção
addicional:



VERSOS INTIMOS [P]


Vês?! De que te serviu tamanho nabo
E esse par de colhões, tão volumoso?
Somente o meu caralho - esse guloso -
Foi amigo sincero do teu rabo.


Accostuma-te sempre ao meu peru.
O puto que, no mundo miseravel,
Mora entre machos, sente inevitavel
Necessidade de tomar no cu.


Toma um ovo. Segura esta pichorra.
A foda, amigo, é a vespera da porra.
O pau que fode é o mesmo que se esporra.


Si acaso no teu cu dei algum talho,
Peida no pau a tit'lo de desforra
E caga na cabeça do caralho.



VERSOS INTIMOS [Augusto dos Anjos]


Vês! Ninguem assistiu ao formidavel
Enterro de tua ultima chimera.
Somente a Ingratidão - esta panthera -
Foi tua companheira inseparavel!


Accostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miseravel,
Mora, entre feras, sente inevitavel
Necessidade de tambem ser fera.


Toma um phosphoro. Accende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a vespera do escarro,
A mão que affaga é a mesma que appedreja.


Si a alguem causa 'inda pena a tua chaga,
Appedreja essa mão vil que te affaga,
Escarra nessa bocca que te beija!



[8] Muitos dos sonnettos de CANTHARIDAS eram compostos a duas ou mais
mãos, mas nem sempre resultavam no melhor da collectanea. Uma excepção é
o que vae abbaixo, pela faceta escatologica e onanistica que a mim tanto
valeu, ao sonnettar, como motivo conductor em innumeros casos. As
allusões fecaes, a meu ver, são os condimentos mais appigmentados em
outros sonnettos que me chamam a attenção e vão transcriptos na
sequencia:



CONSOLO [J/P]


[J] Arregaçando a piça, o bom sacana,
[J] E descobrindo o roxo cabeção,
[P] O sebo armazenado ha uma semana
[J] Excorre, esverdinhado, pelo chão.


[P] Um bodum de caralho se desprende,
[J] Empesteando o ar em deredor;
[P] Emquanto a pel' da piça se distende,
[J] Fica a bichoca cada vez maior.


[P] Depois da piça bem escramellada,
[J] E bem limpa do queijo faisandé,
[P] Tenta dar na cabeça uma chupada.


[J] Mas não pode! E, feroz comsigo mesmo,
[P] O Bundinha, p'ra supprir o buchê, [dysrhythmico]
[P] Se põe, fagueiro, a espunhetar-se a esmo...



{Eis uma satyra que focaliza Guilherme numa scena phantastica de
erotismo solitario, a que não falta nem mesmo a frustrada tentativa de
autofellação.}



MUSA FESCENNINA [G]


Jorra a coprolalia ramellenta
Cuspindo a baba, babugenta e excusa,
E o puz pullula e a podridão rebenta
Cascateante, a cascalhar confusa.


Fedor s'espalha sob luz diffusa;
É merda! Molle merda pegagenta!
E a feder assim tanto, a bosta abusa,
Da mais fechada e malcheirosa venta.


Mas que cloaca é essa que assim caga,
Aos borbotões, bollotas de escorbuto,
E nella se chafurda e se allaga? [enneasyllabo]


"Eu sou" - responde ella em tom gottoso, [enneasyllabo]
"Eu sou a Musa do poeta-puto,
Chamado Paulo de Tarso Vellozo." [dysrhythmico]



PELO FARO [P]


Eu estava deitado. O meu caralho
Dormitava, entre as coxas encolhido;
Da urethra entreaberta, um fino orvalho,
Gotta a gotta, pingava, sem ruido.


Porem, umas aragens catinguentas
Despertam meu caralho. Este boceja,
E da urethra escancarando as ventas, [enneasyllabo]
Ergue a cabeça como quem fareja.


A veia azul - de baixo - se intumesce!
O nabo dá corcovos de gymnete!
Depois, suando porra, se esmoresce...


E eu, qu'as paixões da piça sei ao certo,
Penso, fictando o misero cacete:
"O Jayme andou cagando aqui por perto..."



TO BE OR NOT TO BE [G]


Cagar ou não cagar, eis a questão
Que ora enfrenta Renato, pensativo,
Emquanto tem no rabo o vil tampão
E agguarda o seu primeiro curativo.


Cagar ou não cagar... eis o motivo
Por que sua e tressua o Renatão,
Ja sentindo - mais morto do que vivo -
No castanho terrivel comichão...


- Será que eu dando um peido, devagar,
Não seria melhor e mais prudente
P'ra meu olho do cu se accostumar?


Mas tem receio o pobre do doente,
E, ja agora: Peidar ou não peidar,
Eis a questão que lhe fatiga a mente...



{Escripto por Guilherme por occasião da operação de hemorrhoidas a que
se submetteu, em fins da decada de 1950, seu amigo Renato.}



[9] Ainda si descomptassemos a frouxidão commum aos versejadores que
escandem abusando da dierese (como na cantoria nordestina), uns tantos
decasyllabos de CANTHARIDAS cahiriam inevitavelmente na categoria dos
que soffrem de catalexe. Menos frequentes são os casos de hypermetria,
que não se salvam nem com synereses forçadas. Alguns exemplos de versos
catalecticos são estes, garimpados de differentes poemas:


Pornographicamente é um nababo! [e/é/um]


Veiu a Orly ficar no seu logar [u/a/or]


Si é o beiçolão, paresce jaca [si/é/o]


Pedi para metter só um pouquinho [só/um]


Encostei-o a um cantho da banheira [o/a/um]


Do entrecu, na rala pentelhada, [do/en]


Nem massaroca bruta que a espante! [que/a/es]


Por ser irmão do puto e, assim sendo, [to/e/a]


E, apoz o grande e onanesco feito, [de/e/o]


Agora alguns casos de verso hypermetrico, salvo eventual erro de
transcripção, todos hendecasyllabos e relativamente faceis de corrigir
si os auctores se tivessem detido em escandir com mais cuidado:


Vivem a fazer sonnettos immoraes.


Escondendo aquella origem infamante!


Ou de elephante que accaba de parir!


E teu caralho inutil e sempre só.


Fique claro que taes versos não compromettem, a meu ver, a integridade
lyrica nem a esthetica hedonistica da obra velloziana. Menos
compromettedores ainda são os innumeros casos de rhymas pobres, de
dysrhythmias, de solecismos e de syllepses, folgadamente compensados
pela musicalidade paronomastica e pela riqueza pittoresca dos chulismos
e girias da epocha, particularmente nestes synonymos do penis que fogem
ao ramerrão entre "pau", "picca", "piça" e "caralho": "bichoca",
"caceta", "cates" ou "cátis" (corruptela de "cazzo"), "gerica",
"linguiça", "malho", "manzarpo" (variante de "marzapo" ou "marsapo"),
"massaroca", "nabo", "p'ra-ti-leve" (variante de "p'ra-ti-vae"),
"pau-de-sebo", "pé-de-porco", "peru", "piccalhão", "pichorra", "tatu" e
"vergalhão", entre outros.


[10] Concluindo, independentemente de quaesquer quinaus, subsiste o caso
litterario das CANTHARIDAS como authentico phenomeno de creatividade
collectiva no genero fescennino e na vertente homoerotica, practicamente
inegualavel na historia lusophona em termos de laboratorio ou de
officina duma contracultura avant la lettre, antecipativa da actual
liberação dos costumes e da diversidade sexual. Como obra excepcional
que foi, CANTHARIDAS se constitue num accidente de percurso na
trajectoria da poesia brazileira, que então attravessava um periodo de
transição entre o parnasianismo, o symbolismo e o modernismo, este ainda
enfrentando as naturaes resistencias às innovações estheticas.
Chronologicamente, tanto a formação quanto a informação de Paulo Vellozo
e de seus parceiros só podia ser passadista na forma, embora
vanguardista no fundo.


Não seria nenhuma "forçação de barra" adventar um parallelo entre a
parca bibliographia em braille disponivel ao publico cego (na qual
sempre faltaram obras pornographicas, devido à caretice que cerca o
assistencialismo aos deficientes) e a illimitada vastidão de fontes
disponiveis aos cegos que teem accesso à technologia cybernetica, como
si o computador fallante viesse libertar ou liberar da censura
institucional aquelles subjeitos encarcerados pela escripta tactil que
os manieta e os disciplina a serviço duma pharisaica moralidade
official. Assim como um cego gay, fetichista e sadomasochista, pode não
ser um individuo isolado caso se expresse poetica e digitalmente, tambem
uma tertullia de gays clarividentes pode voltar a ser porta-voz, na era
da recyclagem virtual, duma subterranea parcella da população que, em
todos os tempos, manteve-se no armario da conveniencia social.


Nunca é despropositado lembrar que a poesia, a despeito de seu restricto
alcance, eventualmente pode ter papel mais revolucionario que o das
demais linguagens, sobretudo num contexto onde nem o theatro, nem
tampouco o cinema, funccionavam como pretexto satisfactorio para que o
artista se assumisse e deixasse inscripto à posteridade seu testemunho
de vida, como lograram deixar aquelles dois ou trez heroes dionysiacos
que souberam se expressar num discurso apollineo, equilibrando as
contradicções e os paradoxos.


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